sábado, 17 de abril de 2010

eu quero escrever
agora
para todas as pessoas
que já me leram aqui
para todas aspessoasquenuncameleramaqui
para todos queles
que ainda
eu sei
meu deus
eu sei
ainda vão me ler
por acaso
num dia de chuva
num dia de portas fechadas
e olhos cerrados das amadas
num dia de mensagens
felicíssimas
de celular
num dia de massagens
sensualíssimas
nas costas cansadas
de encosto de banco
de ônibus
num dia de não ter
que ter medo
de ter uma arma de fogo
apontado nas ventas
pelo simples fato dos ventos
vomitarem
por acaso
mais moedas que piadas
em meu corpo
num dia de ternuras tantas
que as danças de todos os povos
e suas tranças
não dão conta de tanta andança
na alma

sexta-feira, 16 de abril de 2010

cinema

cheiro de gelol
a nuca tesa em minhas mãos
a noite é quente
já choveu
um guarda-chuva sabe
o chão da sala sabe
o cabo pinga
o dia finge
o corpo deita
já não quero
amigos riem
sobre a noite
a noite chama
sobre a noite
a cama pede
o corpo clama
o nosso jantar

sexta-feira
sesta em torno
mãe que chama
dor na costa
cheiro de gelol
nuca tesa em minhas mãos

Ciclo

E os paraenses querendo ser paulistas
com suas jaquetas,
8h30, sol a pino,
na almirante barroso, domingo,
com sua pele encardida metida
a branco encardido,
brasão do corintias,
fone de ouvido
e sotaque italiano.

E os paulistas doidos pra serem
norte-americanos,
com seus silêncios fedendo
a grana
e seus abraços com cheiro
de grana
e o seu drama e o seu caos
por não ser um país
movido ao amor e à beleza
da grana.

E os estadounidenses,
ou norte-americanos,
ou filhos do mickey,
perdidos com o próprio peso,
fudidos no próprio dólar,
cansados de tanta merda
e de pensar que o mundo pensa
que eles querem
que pensem
que são
os donos do mundo...

E os paraenses querendo ser paulistas

quarta-feira, 7 de abril de 2010

Conversa

A política ama,
ela me disse
enquanto coçava o nariz.
Eu disse: eu sei.
E ela disse: não parece.
E enquanto disse
os seus olhos brilharam
e saltaram das órbitas
e pularam sorrindo
sobre as lentes de contato.

-Eu concordo,
embora talvez eu não veja
exatamente
como tu.
Mas também,
veja bem,
eu não tenho
esta cor
este riso
e esta brisa nos olhos.

E ela disse: eu sei...
e eu não escutei
pois seus olhos dançavam demais
e eu não pude escutar mais nada.

terça-feira, 6 de abril de 2010

Ninguém viu


Numa terra de migalhas
onde as ruas são de plumas
há um homem que há muito
foi embora.
Sua cama, arrumada,
tem os moldes de seu corpo
e a sombra da sandália
marca seu canto no quarto.
A cozinha brilha e cheira
a produtos de limpeza.
A salada de alface enfeita
a velha geladeira.
O homem não come vegetais.

A tinta da parede da sala
é branca.
A borda da velha janela
é branca.
A tampa da voz de quem fica
é branca.
E o relógio é quem reza o evangelho.

No dia em que partiu
dobrou as sete camisas
e esticou o olhar para o chão.
Pôs duas notas
embaixo do vaso de plástico,
regou o pote dos cães.

Hoje não há ele
na casa onde o homem mora.
E apenas as plumas
e migalhas
e, quem sabe, as cigarras
ligam para isso.

Ontem fez três anos

segunda-feira, 5 de abril de 2010

Regra Geral

Assim como todas as linhas são tênues
E todos os tetos são tensos
Todas as tardes não tardam
E todos os peitos são pensos

Como todas as mãos são manhosas
E todas as manhas são fanhas
Feito as tintas; tinhosas
E cheias de pira as piranhas:

A verdade é vaidosa
Tudo o que baba é rebanho
Toda gastura é gasosa
Todo temor é tamanho.